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Por que falar de protagonismo feminino na Igreja?


Mulheres protagonistas na ação eclesial (Créditos: Observatório da Evangelização, CNBB e cathopic.com)


“Para alguns pode parecer óbvio falar na discrepância de oportunidades de estudo e desenvolvimento, de espaços de atuação, na diferença de valoração, inclusive econômica, entre homens e mulheres na sociedade e na Igreja.”


Numericamente, as mulheres são a maioria nas comunidades eclesiais, atuam nas diversas pastorais, mas não recebem o devido reconhecimento e o incentivo para a formação qualificada. Você já se perguntou porque isso acontece?

“É fundamental motivar o conhecimento e esclarecimento sobre a importância de incentivar o estudo e a visibilização da mulher como sujeito eclesial na missão de comunicar e construir o Reino de Deus.”

A reflexão é autoria da professora Aline Amaro da Silva, mestra e doutora em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), com doutorado sanduíche (bolsa PDSE/Capes) na Ruhr Universität Bochum, Alemanha. Fez estágio pós-doutoral (Coimbra Group Scholarship Programme) na Universidade de Graz, Áustria. Jornalista graduada pela PUCRS. É membro do Grupo de Reflexão sobre Comunicação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (Grecom/CNBB). Professora Adjunta do ANIMA – PUC Minas, pesquisadora do Núcleo de Estudos em Comunicação e Teologia (NECT/PUC Minas). Professora colaboradora da Pós-graduação em Espiritualidade e Estudos da Consciência da PUCRS.


Confira


O debate dos candidatos e candidatas à presidência da República deste domingo, 28 de agosto de 2022, teve diversas questões relacionadas à realidade da mulher, tais como a falta de segurança, a disparidade de postos de trabalho e salário em comparação ao homem. Embora formemos a maior parte da população brasileira, há baixa representatividade feminina em cargos políticos e na sociedade em geral. O mesmo ocorre no campo religioso. As mulheres são maioria nas igrejas e, mesmo assim, raras são as que recebem encorajamento e apoio para aprofundar sua formação teológica, qualificar sua ação e liderança pastoral.

Por que pensar em protagonismo feminino hoje no âmbito eclesial? Para alguns pode parecer óbvio falar na discrepância de oportunidades de estudo e desenvolvimento, de espaços de atuação, na diferença de valoração, inclusive econômica, entre homens e mulheres na sociedade e na Igreja. Mesmo assim, muitas cristãs e cristãos desencorajam a reflexão sobre essa desigualdade e desacreditam quem se propõe a buscar soluções para construir uma Igreja sinodal que seja lar de todas e todos. Cresce o número de fiéis que, infelizmente, olham com desconfiança para quem promove a participação eclesial mais efetiva e equilibrada entre homens e mulheres que possuem a mesma dignidade batismal.

Sobre a atuação da mulher na formação, faço uma partilha. Já tive a oportunidade de assessorar encontros de formação de presbíteros. São experiências ricas de aprendizagem mútua e que me honraram pela realização destes trabalhos. Mas é interessante perceber as reações e a surpresa de membros do clero ao ver que a formação será conduzida por uma mulher e ainda “jovem”. Por que em pleno século XXI ainda causa assombro a presença de uma formadora na Igreja e teologia?


Então, é fundamental motivar o conhecimento e esclarecimento sobre a importância de incentivar o estudo e a visibilização da mulher como sujeito eclesial na missão de comunicar e construir o Reino de Deus. O Documento de Aparecida, ao propor a permanente conversão pastoral a todo Povo de Deus, recorda que é preciso “escutar com atenção e discernir ‘o que o Espírito está dizendo às Igrejas’ (Ap 2,29) através dos sinais dos tempos nos quais Deus se manifesta” (DA 366).


Em busca dessa contínua conversão pastoral, fiz junto com uma colega teóloga, Ir. Elis Machado, um exercício de escuta a partir de uma pesquisa de opinião realizada no segundo semestre de 2021 entre teólogas e estudantes de pós-graduação em teologia intitulada “Mulheres na Teologia Brasileira”.[1] Ao todo, 53 mulheres de todo Brasil responderam a um questionário on-line com perguntas abertas e fechadas sobre a presença, visibilidade e realidade feminina no campo teológico.


Um dos resultados que mais me chamou a atenção na pesquisa foi constatar que as mulheres presentes na teologia brasileira têm tudo duplo: antes de se aventurarem no estudo teológico, se formaram em outra área do saber para se sustentarem. Logo, muitas delas fazem dupla jornada de trabalho e um esforço dobrado para conseguirem certa notoriedade no campo teológico.


Além disso, a maioria das entrevistadas expressou intenso engajamento pastoral, suas práticas como sujeitos eclesiais as levaram à busca por aprofundamento teológico. Algumas delas iniciaram seus estudos em teologia depois de anos de dedicação a outro campo profissional, até mesmo após a aposentadoria. Isso demonstra não apenas a sobrecarga, o esforço e a determinação dobrada da mulher que quer teologizar, mas também que a produção teológica feminina geralmente é interdisciplinar, relevante e de qualidade.

Apesar da competência, as participantes do estudo relatam a falta de espaço feminino significativo para o exercício da teologia e a consequente invisibilidade de boa parte delas. Os poucos lugares ocupados por mulheres são brechas deixadas ou cedidas por seus colegas homens. Escutamos, até daqueles conscienciosos que buscam igualar a participação de teólogas e teólogos em eventos da área, como é difícil encontrar mulheres capacitadas para tais tarefas. Embora existam teólogas para isso, a dificuldade está em descobri-las, pois a maioria é desconhecida. As poucas que adquiriram notoriedade acabam sendo sobrecarregadas. Além disso, as oportunidades para as mulheres estudarem teologia são bem menores do que a dos homens.


Passos, ainda que tímidos, estão sendo dados para modificar este cenário eclesial desfavorável ao feminino. O Papa Francisco vem sinalizando desde o início do seu pontificado a necessidade de esclarecimentos e de abertura de “espaços para uma presença feminina mais incisiva na Igreja”, especialmente nos “lugares onde se tomam as decisões importantes, tanto na Igreja como nas estruturas sociais (EG 103).

Fazendo ressoar as vozes dessas mulheres que reivindicaram acesso à educação e à produção teológica feminina, Ir. Elis Machado, professora Solange Maria do Carmo e eu criamos uma pós-graduação em Protagonismo Feminino na Igreja. Esta especialização, que está sendo ofertada pela PUC Minas, visa ser um espaço de formação de mulheres e homens que desejam compreender o papel imprescindível do feminino no Cristianismo ontem e hoje.


O curso na modalidade on-line foi pensado e estruturado a partir de seis eixos: História, Espiritualidade, Teologia Sistemática, Teologia Pastoral, Bíblia, Gestão e Liderança, Comunicação. O objetivo é fornecer subsídios para a promoção de projetos de colaboração feminina mais efetiva na Igreja, teologia e sociedade. Para mostrar que temos mulheres de alta competência acadêmica, sem desmerecer a contribuição masculina que está mais que constituída, convidamos apenas professoras de teologia para ministrar as disciplinas dessa pós-graduação. Temos a alegria da participação de professoras internacionais como Maricel Mena López, docente e pesquisadora da área bíblica da Universidad Santo Tomás (Colômbia), e Gunda Werner, professora de Teologia Sistemática da Ruhr Universität Bochum (Alemanha) e presidenta da Agenda – Fórum de Teólogas Católicas Alemãs.


O período de inscrição foi prorrogado, os valores do curso foram reduzidos para se tornar mais acessível e ainda a PUC Minas está concedendo bolsas de 50% ou mais para pessoas de baixa renda. Com todo este incentivo, não dá para perder. Vamos valorizar os raros oásis que se abrem neste cenário desértico do protagonismo teológico-eclesial feminino. Para mais informações e inscrição, visite a página do curso.


Dialogar sobre protagonismo feminino na Igreja e promover um curso para entender e desenvolver melhor o papel das mulheres como sujeitos eclesiais não é rebeldia, nem oposição aos homens ou aos ministérios ordenados. Ao contrário, é a busca do lugar legítimo da contribuição efetiva de mais da metade do Povo de Deus, conscientes de que sem as mulheres, não há Igreja. O Papa Francisco (2015) apontou como um desafio eclesial inadiável de fazer com que as mulheres “se sintam não hóspedes, mas plenamente partícipes das várias esferas da vida social e eclesial”. Portanto, esta temática, longe de estar superada, é essencial se a Igreja quer ter um futuro e mesmo um presente.


Referências


CELAM. Documento de Aparecida. 10. ed. Brasília: Edições CNBB, 2009.

FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium. Roma, 2013. Disponível em: https://w2.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papa-francesco_esortazione-ap_20131124_evangelii-gaudium.html. Acesso em: 08 jun. 2022.


FRANCISCO. Discurso do Papa Francisco aos Participantes na Plenária do Pontifício Conselho para a Cultura. Roma, 2015. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/speeches/2015/february/documents/papa-francesco_20150207_pontificio-consiglio-cultura.html. Acesso em: 29 ago. 2022.


[1] O artigo em processo de publicação estará disponível no site: https://eplus.uni-salzburg.at/csrt/.



Fonte: Portal Via Humanitatis




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